domingo, 20 de outubro de 2013

O início desta aventura


Lavrando a terra ao fim de 30 anos

A possibilidade de eu e os meus podermos trabalhar a terra, chegou-nos através de um benemérito proprietário, que preferiu ceder-nos um dos seus terrenos por tempo indeterminado, a vê-los a monte como estiveram durante mais de 30 anos. 
Porém, eu não fazia a mínima ideia do estado deplorável em que a terra se encontrava.

Depois de limpas as bordas, a primeira cavadela pôs a nu a cruel realidade, e deu-me o primeiro aviso de que a coisa não seria fácil.
A enxada, saltava literalmente, de cada vez que violentamente embatia no solo. Muito dificilmente poderia cultivar um palmo de terra, cingindo-me à utilização desta ferramenta.
Como tinha em mente semear batatas e cebolas, para começar decidi revolver completamente a terra, o mais fundo que conseguisse, por forma a eliminar as infestantes, e promover o arejamento da terra. 

Recorri então aos serviços de um tractor pesado, e lavrei a terra a uma profundidade de quase 0,5 metros, deixando-o repousar cerca de 30 dias, para depois proceder à sua fresagem.

Não foi fácil.

A minha ligação à terra...

Trabalhar a terra fascinou-me desde sempre.

Em miúdo, quando acompanhava o meu pai nas deslocações à sua exploração pecuária, admirava pelo caminho o contraste entre os grandes tractores e as suas enormes alfaias em trabalho, sulcando a terra até ao infinito, e as mulheres, que com um sacho muito curto, cavavam vergadas pelo seu próprio peso, ao qual por vezes se somava também, o peso de um filho cuidadosamente aconchegado ao corpo com uma capulana.
É que, nasci em Moçambique, e ali, o conceito de agricultura, horta e distância é muito diferente daquele a que estamos habituados por aqui. Aliando isto, ao facto de nessa altura ver o mundo com os olhos de uma criança, a terra engrandeceu-me o fascínio.

O autor com os pais e irmã em Sabié, Moçambique

A minha avó materna, transmitiu-me o gosto por plantar e ver crescer a batata-doce, o ananás, os tomateiros e as árvores de fruto, cujos cheiros ainda hoje me alimentam os sentidos. O meu avô paterno, matreiro, deixava-me contemplá-lo durante horas a fio, fazendo então o que hoje chamamos de horta urbana, na Foz do Douro, intervalando esses momentos com a degustação de figos pingo-de-mel, subtraídos aos ramos da figueira que coabitava o seu quintal, e o pregar-me algumas partidas  que guardo com saudade.

Com a juventude, a ausência de raízes que me prendessem à terra fizeram com que me alheasse. Só agora, com 50 anos, despertei para o regresso.
Fi-lo, por uma necessidade emergente de saber de que me alimento e o que comem os meus, e porque chegou a hora de lhes legar um passado, confortá-los no presente, e dar-lhes algumas ferramentas que lhes permita encararem o futuro com realismo e esperança.